segunda-feira, 3 de maio de 2010

UNO























Trago ao espaço da «Rádio Crítica» memórias de um passado que vivi e um outro, anterior a esse. Começando pelo mais antigo, quando o Conjunto Universitário Hi-Fi surgiu em Coimbra nos finais de 1966. Era formado por Alexandre Carlos Reboxo Vaz (viola-baixo), António Manuel Freitas (bateria), Luís Manuel Paula de Matos (viola-ritmo), Carlos Manuel Correia (solista) e Ana Maria (voz). A qualidade vocal da cantora deu nas vistas e não passou despercebida.
Surgiram elogios de todos os lados, mas Ana Maria (mais tarde conhecida por Ana Maria Delgado) não seguiu a carreira musical, preferindo a vida académica e a docência. Ana Maria Delgado, doutorada na Alemanha (Germânicas) e, até há poucos anos, docente na Universidade de Viena (Áustria), rumou posteriormente para o outro lado do Atlântico onde reside e continua a leccionar.
Ana Maria Delgado realizou entre 1989 e 1993 um dos mais belos programas dos últimos vinte anos na rádio portuguesa. O programa «UNO» esteve na grelha de fim-de-semana da RJC – Rádio Jornal do Centro e da TSF – Rádio Jornal. Uma hora semanal de palavra e música. A palavra era em forma de texto curto, poético ou em prosa, nas vozes de várias pessoas convidadas pela autora. De aura romanesca, os textos seleccionados eram de teor predominantemente melancólico, nostálgico e saudosista.
De carácter intemporal, o requintado programa «UNO» poderia ter sido realizado nos anos 50 do Século XX, ou hoje mesmo. Ou até amanhã. Trespassa por ele a beleza dos grandes musicais da Broadway e o charme da Boulevard. O «UNO» acabou de forma abrupta em 1993, aquando da unificação da emissão nacional da TSF, acabando com os períodos de emissão regional no Porto e em Coimbra (Faro esteve previsto mas nem chegou a arrancar). Aliás, a maior parte das emissões de autor ao fim-de-semana (a «Íntima Fracção» manter-se-ia por mais dez anos) também terminaram na mesma altura, muito por causa da fragmentação dos horários das transmissões dos jogos de futebol do campeonato português. Como, aliás, acontece hoje em dia, com os encontros a disputarem-se separadamente na maior parte dos dias da semana. Uma modificação em nome do negócio comercial que não tornou a “telefonia” mais “bonita”.
Mas isso não serve de desculpa. O programa poderia ter continuado a existir. Caberia muito bem na programação. Não faltaria oportunidade de incluir um conteúdo desta natureza. E que falta fazem estes espaços!
Actualmente só existe um espaço radiofónico com características semelhantes – musicalmente falando – ao «UNO», que é o programa «A Menina Dança?» de José Duarte [RDP-Antena1], que de resto é pouco posterior ao nascimento de «UNO». A questão da permanência deste tipo de sonoridade na Rádio em Portugal é mais pertinente do que se julga. A começar pelo serviço público de radiodifusão. Se não existisse Rádio pública não existiria este conceito na rádio em Portugal e enquanto houver um homem como José Duarte, lúcido e de boa saúde, a menina continuará a dançar. Mas quando já não houver o Jazé? Como será? Onde iremos continuar a ouvir os grandes standards do Jazz vocalizado, as canções e as danças de salão, do Swing, os grandes vocalistas e os grandes compositores clássicos norte-americanos da primeira metade do século XX, para além das grandes orquestras dos anos 20, 30 e 40? Deixo-vos no rodapé deste texto a ligação para a escuta (também dá para guardar) do indicativo de «UNO».
Belíssimo! Só pelo genérico de abertura (e fecho) o programa arrebatava. Um fragmento de um tango, de nome “Uno”, e um texto lapidar na voz de Francisco Amaral, numa só frase:

Sem música não há vida
Não há vida sem música
Uno
Uma emissão de Ana Maria Delgado











Ouvir o Conjunto Universitário Hi-Fi na Internet no sítio MySpace
(Destaque para a versão de “I Call Your Name”, original dos Beatles, também versado pelos The Mamas and Papas)

Mais sobre o Conjunto Universitário Hi-Fi no blogue «IÉ-IÉ» do ex-radialista [Renascença/RFM] Luís Pinheiro de Almeida aqui

Mais sobre Ana Maria Delgado aqui
Indicativo «UNO»: ouvir e/ou guardar aqui

Texto originalmente publicado no blogue «Irmandade do Éter» (24 de Abril 2010)



<< Home