quinta-feira, 25 de outubro de 2007

A Ciência e a Rádio

CONFERÊNCIA GULBENKIAN: A CIÊNCIA TERÁ LIMITES?
“A Ciência terá Limites?” é a interrogação de partida para a Conferência Gulbenkian 2007 que se realiza a 25 e 26 de Outubro, no Auditório 2 da Fundação. A reflexão incidirá sobre a eventual crise ontológica na Ciência: se os progressos científicos têm motivado os avanços da história desde os tempos pré-socráticos, a Ciência estará agora a entrar num beco sem saída devido às limitações técnicas e à incapacidade de comprovar novas teorias? Esta vai ser a questão de fundo presente nas intervenções dos oradores convidados. O professor e ensaísta George Steiner, convidado a conceber esta conferência e João Caraça, director do Serviço de Ciência da Fundação, deixam duas perspectivas em forma de análise introdutória para estes dois dias de reflexão.

















George Steiner está hoje e amanhã em Lisboa. Com ele estará, entre outros intervenientes, Freeman Dyson, um dos maiores físicos teóricos do mundo, responsável por estudos avançados sobre Mecânica Quântica. Dyson tem, ao longo da sua carreira, aflorado os limites da ficção científica.
Para além do tema título da Conferência, vai falar-se da Teoria das Super-Cordas que tanto me tem apaixonado nos últimos tempos (e que continua. Faltam-me centenas de páginas para concluir a leitura da teoria explicativa, da autoria de Edward Witten).
Da revolucionária teoria das cordas não se vai chegar a nenhuma conclusão, como se sabe de ante mão. Nem tão pouco se pretende, em escassos dois dias, reduzi-la à simplicidade de uma fórmula matematicamente composta por beleza, como fizeram Newton (F=ma) ou Einstein (E=mc2). Apesar disso, quão deliciosa é uma conversa sobre o assunto!
Ao Professor Steiner devo construtivas leituras, através de livros tão interessantes como «Errata» ou «A Ideia de Europa» e, principalmente, pela inquietante questão que ele foi um dos primeiros a levantar no século XX: “Como se pode tocar Schubert à noite, ler Rilke de manhã e torturar ao meio-dia?” Sobre esta pergunta, Steiner não encontrou ainda uma resposta cabal.

Sobre os limites da ciência
A introdução de Steiner não deixa dúvidas. Estamos perante uma das novas e mais intrigantes questões da Humanidade:

Desde os filósofos pré-socráticos até ao presente, a civilização ocidental tem sido virtualmente motivada pela confiança axiomática depositada no progresso científico. Podem ter existido erros (a cosmografia de Ptolomeu), momentos de regressão e de frustração, mas o movimento impulsionador da descoberta e do conhecimento científicos parece ter definido o da própria razão. A relação do pensamento humano com os avanços científicos foi fundamental para a antropologia, para os modelos da história humana implícitos em Galileu e Descartes. Foi fundamental para o estabelecimento da modernidade, do positivismo e do conceito de verdade nos trabalhos de Newton, de Darwin e dos seus sucessores. Por sua vez, as teorias científicas subscreveram a evolução constante da tecnologia na qual as sociedades ocidentais alicerçaram o seu poder. Tal como Bacon e Leibniz pregaram, as portas do progresso científico teórico e aplicado estiveram sempre abertas, definindo o horizonte do amanhã.
Será que continua a ser assim? Estarão agora à vista certos limites, certas barreiras às nossas expectativas? A possibilidade de a Teoria das Cordas não poder ser verificada nem falseada implica uma crise ontológica no seio do próprio conceito de ciência. Há motivos intrínsecos que nos levam a acreditar que a cosmologia e a correspondente exploração do microcosmos são as suas fronteiras. Não há nenhum instrumento de observação por mais sofisticado que seja que nos permita prosseguir para lá das «paredes douradas» externas ou internas do nosso possível universo local. O conhecimento da consciência tem-se mostrado radicalmente evasivo. Pode muito bem acontecer que as analogias computacionais constituam um beco sem saída. A incompletude e a indeterminação, exemplificadas pelas obras de Gödel e de Heisenberg, são «muros» contra as quais a razão embate em vão. A acentuada diminuição do número de estudantes inscritos em cursos de ciências «duras» no Ocidente é sintomática. Tal como o são as novas ondas de racionalismo, irracionalidade, fundamentalismo e superstição que actualmente se abatem sobre nós.
As conjecturas estarão certamente sempre erradas. A biologia sintética e a biogenética, a biocomputação, o aproveitamento de bactérias em processos industriais prometem avanços espectaculares. A matemática progride, por assim dizer, autonomamente. No entanto, talvez as grandes ciências clássicas e a sua auto-confiança se estejam a desvanecer, o que constituiria uma grande revolução em todos os domínios da consciência e da sociedade.
Esta Conferência pretende explorar algumas das possíveis consequências. O Concorde foi uma maravilha aerodinâmica, tecnológica. Não há qualquer intenção de o voltar a fazer voar.
George Steiner

Esta conferência conta com vários intervenientes nacionais e internacionais, sendo os nomes presentes mais sonantes os de George Steiner e de Freeman Dyson.
Já se sabe e já aqui se disse que as questões científicas (e outras) não têm tido grande atenção por parte dos media tradicionais, entre eles, a Rádio. Apesar de, nos anos mais recentes – desde o ano 2000 – a ciência tenha merecido uma atenção mais próxima por parte da Rádio, mas não de forma contínua, sendo uma abordagem sazonal.
Esta iniciativa da Gulbenkian tem na Rádio um dos seus apoios. Gostaria de ouvir na Rádio ecos desta conferência. Gostaria que Steiner povoasse o éter com a sua visão do mundo em geral e do futuro da ciência em particular. Também Freeman Dyson. Tanto tempo de antena que as rádios dedicam a jogadores de futebol, políticos, porta-vozes de tudo e de nada, gente sem o mínimo de interesse e gente com muitos interesses, e será possível que não arranja um pouco de tempo para dois dos mais brilhantes pensadores ainda vivos? Quero acreditar que os vou ouvir na Rádio. Vou estar atento. Vou estar à espera.

Entretanto, espero também que, avaliando pela excelente qualidade dos intervenientes, esta iniciativa em nada fique a dever à espantosa intervenção de há dez anos do paleontólogo Stephen Jay Gould, na altura falando sobre a Teoria da Evolução.
A conferência «A Ciência Terá Limites?» decorre hoje e amanhã no Auditório 2 da Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa e a entrada é livre.

Ver programa completo. Hoje com George Steiner e amanhã com Freeman Dyson.


We have no more beginnings
George Steiner



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